
SOBRE RESPIRAR DA TERRA
Sobre a superfície rugosa da cortiça — matéria antiga, saída do próprio tronco do mundo — repousa uma forma de vidro soprado que lembra um cristal nascente ou uma gota de água suspensa no instante da criação. Transparente, irregular, quase viva, ela parece conservar o sopro que lhe deu forma.
Ao seu redor, o musgo irrompe em verde profundo, preenchendo de vida cada fissura da cortiça. Ali manifesta-se aquilo a que chamamos biophilia: a tendência inata que os seres humanos têm de procurar ligação com a vida e com tudo o que cresce, pulsa e respira. É esse instinto antigo que nos aproxima dos organismos vivos e dos padrões naturais, lembrando-nos, de forma subtil e clara, que somos apenas uma pequena parte da vastidão que nos sustenta.
Nesta composição criada pela artista Adosa, o vidro capta a luz; a cortiça guarda a memória da terra; o musgo oferece renovação. Juntos, criam um microcosmo onde matéria e vitalidade se entrelaçam numa harmonia silenciosa.
E o vidro, cristalino como água que se deteve no tempo, repousa sobre o corpo quente da terra para revelar que a natureza — o que flui, o que cresce e o que permanece — não existe para nós, mas connosco. É nela que encontramos o eco mais antigo da nossa própria origem.
