
SOBRE O FIO QUE INSISTE
A madeira levanta-se como um vestígio de percursos que já não existem. Nos seus ramos interrompidos vive a memória de decisões antigas — trajetos que começaram a formar-se e desapareceram antes de encontrar destino. É um corpo marcado por ausências, por silêncios que substituíram o movimento.
E, atravessando essas falhas, surge o fio.
Tenso, delicado, quase improvável, ele estende-se como o eco de um rumo que se perdeu no tempo. Não o recria, mas indica-o; não o revela por inteiro, mas sugere a direção onde o passo se quebrou. O fio guarda aquilo que a madeira tentou esquecer: o indício de que um caminho existiu e ainda murmura.
É um gesto teimoso contra o vazio — uma leve linha que se recusa a deixar que a perda seja completa. Entre o que falta e o que resta, o fio desenha uma fronteira viva, mostrando que mesmo na ruína há algo que continua a apontar para fora, para além, para antes.
Assim, O Fio que Insiste torna-se lembrança e proposta ao mesmo tempo: o resíduo de um percurso apagado, mas também a pequena força que o mantém aceso. O fio não traz o caminho de volta; apenas afirma que ele não desapareceu sem deixar rasto.
O FIO QUE INSISTE, 2022. Madeira e rafia, 135cm x 0,66cm x 0,50cm.
